Homenagem a Maria Barroso
A Doutora Maria de Jesus Barroso está indelevelmente ligada à PSIJUS. Poder-se-á afirmar, sem exagero, que a história da PSIJUS foi sempre marcada pela sua presença serena, pelo apoio constante, mesmo nos tempos mais difíceis, pelo carinho e pela solidariedade que permanentemente nos disponibilizou.
A nível pessoal, já a conhecia desde há algumas décadas e aprendera no discurso direto a afabilidade e a compreensão que a caracterizavam; com efeito, tivera o privilégio, em vários momentos anteriores, de testemunhar o sentido humanista e comprometido com a questão social que a movia. No decénio de Noventa, por sugestão de uma amiga comum – a Dr.ª Maryvonne Campinos – colaborei, ainda que modestamente, na formulação do que seria depois uma das obras da sua vida: a Fundação para os Direitos Humanos, Pro Dignitate. Seria, aliás, no âmbito desta instituição que manteria as últimas reuniões com a Doutora Maria Barroso, entre Abril e Maio de 2015, quando, no contexto das funções de vice-reitor da Universidade Lusófona, trabalhámos para a celebração do protocolo de cooperação entre ambas as entidades.
Em 2000, quando me ocupava, com meia dúzia de colegas, do lançamento da área de Psicologia Criminal, convidei-a para uma sessão: estávamos em Maio, o mês da Psicologia Forense. Maria Barroso aceitou o convite e apresentou nesta Casa uma autêntica oração de sapiência sobre os direitos humanos, a liberdade e a paz, deslumbrando as mais de duzentas e cinquenta pessoas que então inundavam o auditório.
Quando, em 2001, convocámos o I Congresso Internacional de Psicologia Criminal e do Comportamento Desviante, realizado na Torre do Tombo, voltei a endereçar-lhe um convite para que viesse à sessão de encerramento, atrevendo-me a pedir-lhe que dissesse, como só ela o sabia fazer, o nosso hino: o Cântico Negro, do Poeta José Régio, que ambos admirávamos. Na manhã do dia em que cairia o pano sobre esse I Congresso, Maria Barroso apareceu, logo às 9 horas, e disse-me, com o sorriso que todos lhe conhecemos, pediu-me que dissesse o Cântico Negro e trago-o aqui. Foi a primeira vez que esse hino ecoou pelas nossas iniciativas; a primeira de outras vezes em que a nossa Amiga o leu em congressos co organizados pela PSIJUS.
Perdem-se no tempo as oportunidades em que Maria Barroso participou nas nossas atividades, quer da unidade orgânica de Psicologia quer da PSIJUS. Constituída esta associação, em Julho de 2001, atribuímos-lhe logo o grau de Associada Honorária, destarte assinalando a ligação afetiva e a ternura que existia entre ela e os membros desta entidade. Muitas e muitas vezes a pudemos ter entre nós, também em cerimónias da Universidade Lusófona, nos bons momentos mas igualmente naqueles em que mais precisávamos de apoio. E várias foram as oportunidades em que me convidou para colaborar com a Fundação a que presidia e foi com redobrado prazer que estive em inúmeras das realizações da Pro Dignitate, assistindo, participando em seminários ou formações. Senti-me sempre da Casa. A Universidade Lusófona do Porto decidiu, entretanto, conceder-lhe o grau de doutora honoris causa – e sei que, apesar de ter recebido plúrimas distinções, essa foi das que mais apreciou.
Mais recentemente, depois de ter sido Presidente Honorária dos II, III e IV Congressos, designámo-la Presidente de Honra de Todos os Congressos da PSIJUS: foi, aliás, nessa qualidade que esteve neste mesmo auditório, pela última vez, em Maio de 2015, no I Congresso da PSIJUS, em cuja mesa de abertura aceitou o meu convite, aí formulado, para ser Presidente de Honra deste X Congresso da AIPJ. Recordar-se-ão alguns da sua resposta: se ainda for viva. Nessa ocasião, em 19 de Maio, esteve connosco toda a sessão; e despediu-se até ao dia seguinte, pois queria assistir à representação da peça de teatro que fecharia a jornada. Lembro-me dos telefonemas que então me fez, no dia seguinte, preocupada por a família entender que não estava em condições de se deslocar; prometi-lhe que em Outubro reporíamos a peça.
Em Junho pretérito, aquando do Seminário organizado pelo município de Odivelas e pela PSIJUS, subordinado às questões da infância e adolescência, participou pela última vez numa ação desta associação de psicólogos forenses, menos de oito dias antes de adoecer.
Ao longo destes anos, estando presente em quase todos os eventos de Psicologia Forense e da PSIJUS, a Doutora Maria Barroso manifestou sempre uma grande amizade. Por nós todos e por mim. Acreditou no projeto da Psicologia Forense, defendeu-o publicamente e carreou uma enorme energia para a sua consecução.
Pessoalmente, encontrei na Doutora Maria Barroso uma amiga muito querida; partilhámos crenças e convicções, desejos de uma sociedade mais justa e perfeita e de uma homeostasia social diferente daquela que as décadas pregressas têm feito afluir à Europa. Esteve sempre presente em todos os acontecimentos mais complexos que vivi, particularmente na doença e morte da minha mãe, comparecendo aqui, no dia seguinte, numa sessão em que eu tinha de participar, pois o meu amigo hoje precisa de apoio; esteve comigo no lançamento de livros meus, tendo apresentado dois deles, com aceitação do convite antes mesmo de conhecer a obra. Sempre que sabia, pelos media, que algum problema afetava a Lusófona, era das primeiras vozes que eu atendia no telemóvel.
Aprendemos todos com as suas palavras. Aprendi muito com a minha Amiga Maria Barroso. Aprendemos as mensagens da tolerância, da liberdade, da solidariedade e da defesa intransigente face aos valores da dignidade humana, outra maneira, aliás, de se dizer o conceito por que combateu toda a vida: a Liberdade plena!
1.Junho.2016
Carlos Alberto Poiares
Presidente da Direção da PSIJUS